terça-feira, 31 de dezembro de 2013

CINEMA, LITERATURA E TEATRO EM 2013


Em termos de vida cultural, esse ano foi bem bacana. Mantive meu interesse de sempre por cinema, teatro e literatura, mas por causa do ingresso na faculdade pude participar de alguns eventos bem legais com famosos e renomados artistas da música e da literatura. Esse foi o ano de conhecer pessoalmente escritores como Andrea Del Fuego, Marçal Aquino, Daniel Galera, Ivana Arruda Leite e a cantora Adriana Calcanhoto - que se aventurou na literatura em 2008 com o livro "Saga Lusa" - em bate-papos descontraídos nos encontros semanais da Biblioteca São Paulo (BSP), que aconteciam todos os sábados pela manhã.

Curti também um show maravilhoso de Ângela Rô Rô na Virada Cultural, que aconteceu no palco do belíssimo Teatro Municipal. Conheci a dramaturga Maria Adelaide Amaral, de quem sou fã de carteirinha, em um outro bate-papo descontraído, mediado pelo dr. Drauzio Varella, no anfi-teatro da Livraria Cultura. Uma delícia sem igual! Também na mesma livraria participei de uma noite de autógrafos com a simpaticíssima cantora, que adoro, Vanessa da Mata, no lançamento de seu livro "A filha das flores".

Mas os filmes, os livros e as peças foram as vedetes de 2013. Abaixo uma pequena lista do que assisti e li esse ano:

Cinema: 
1- As aventuras de Pi, lindo, emocionante, magnífico!
2- Minha mãe é uma peça - o filme, engraçadíssimo do início ao fim. Melhor filme brasileiro de 2013!
3- Cabeça do cachorro, documentário do médico Drauzio Varella sobre uma comunidade no Brasil que vive como índios, quase à margem da sociedade. Interessante!
4- Amor pleno, filme-arte, chato.
5- The bling-ring - A gangue de Hollywood, bom, mas poderia ser melhor.
6- Jobs, gostei, mas esperava bem mais. Poderia ter tido um maior desenvolvimento.
7- Rush - No limite da emoção, filme excepcional sobre um assunto que nunca gostei, fórmula 1. Excelente!
8- O tempo e o vento, a clássica e antiga saga de Erico Veríssimo adaptada para as telonas sob a batuta de Jayme Monjardim. Resultado bonito!
9- Gravidade, o tão falado filme espacial de Sandra Bullock, muito bom, mas não tão bom quanto falaram.
10- Eu vou lhe dizer tudo, belíssimo filme norueguês, exibido no Festival Mix Brasil. Merece ser assistido!         
11- Sobre sete ondas verdes espumantes, documentário poético e emocionante, que também fez parte do Mix Brasil, sobre a obra do escritor gaúcho Caio Fernando Abreu. Lindo demais!
12- Jovem e bela, cinema francês maravilhoso!
13- Las acacias, cinema argentino sempre surpreendendo positivamente.
14- A grande beleza, cinema italiano um pouco pretensioso, porém, inegavelmente belo.
15- Azul é a cor mais quente, premiado filme francês. É tudo o que falaram, mas com final um pouco decepcionante.      

Literatura:
1- Para sempre, romance americano previsível, adaptado pro cinema sem sucesso.
2- Barba ensopada de sangue, excelente lançamento de Daniel Galera.
3- Uma leve simetria, lindo e emocionante romance sobre o amor entre dois adolescentes judeus.
4- A última chance, romance espírita insuportavelmente clichê sobre gays e aids.
5- A cultura-mundo, leitura obrigatória do primeiro semestre do curso de Letras, mas uma ótima leitura, obrigatória pra vida, nesse mundo consumista e plastificado.
6- City boy - Minha vida em Nova York, um passeio pela vida do escritor Edmund White no tempo em que viveu numa das maiores metrópoles do mundo.
7- A foto, sobre o mundo da moda, vaidade e suas futilidades. Contemporâneo. História razoável.
8- Conversas com um jovem professor, didático. Leitura obrigatória do segundo semestre, mas muito bom pra quem se interessa pelo universo professor/aluno.
9- Édipo-Rei, mitologia grega, clássica, super conhecida e fascinante.
10- Refém da obsessão, romance sobrenatural. Ótimo entretenimento.
11- A garota do penhasco, uma saga familiar cheia de mistérios e apaixonante. Ainda lendo.

Teatro:
1- Esta criança, das que assisti, a melhor do ano. Histórias fortes interpretadas pela sensacional Renata Sorrah.
2- Contrações, perturbadora peça com Débora Falabella. Muito boa!
3- Um porto para Elizabeth Bishop, um monólogo de pura emoção com a talentosa Regina Braga. Maravilhoso!
4- Garotos da noite, sobre prostituição masculina, drogas e sonhos. Ótima montagem e elenco de babar!
5- Bem-vindo, estranho, um suspense noir, protagonizado por Regina Duarte, esfuziante e surpreendente em cena. Fechando a temporada teatral do ano com chave de ouro.

E que 2014 venha com muitos, muitos, mas muito mais filmes, livros e peças. Que a arte e a cultural nunca tenham fim!              
 

segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

RETROSPECTIVA 2013: DEZ ANOS EM UM


E estou aqui pra clássica retrospectiva do ano, mas dessa vez mais que relembrar os momentos legais e importantes, fazendo um apanhado geral do que foi 2013 pra mim, é da última década que quero falar. Um "tour" rápido pelas mazelas que vivi nos últimos dez anos pra chegar até aqui, e que olhando pra trás parece muito tempo, mas na prática foi um sopro. Será que cheguei onde queria? Consegui realizar algum sonho? Alcançar algum objetivo relevante? O que mudou efetivamente nesses dez meteóricos anos? Será que foi tempo suficiente pra atingir minhas metas? Teoricamente, mesmo que passe ligeiro, 10 anos é tempo pra se fazer muita coisa. E mesmo que hoje eu ainda não esteja exatamente onde quero e como quero, galgo o caminho que eu mesmo escolhi persistente e insistentemente há dez anos, de forma incansável. Às vezes dando uma descansadinha aqui, outra ali pra recuperar o fôlego, mas nunca pensando em desistir. Contra toda a falta de apoio e incredulidade, estou mais perto do que jamais estive do que sempre almejei ser, ter e fazer como objetivo de vida e felicidade.

O pontapé inicial foi dado no dia 09 de março de 2003. Saí da casa de meus pais no interior do Rio Grande do Sul pra ganhar a capital Porto Alegre e o mundo, meu mundo ideal. Encarei a rotina de um casal de idosos, amigos da família, que me acolheram por uns tempos até eu poder pagar meu próprio aluguel e iniciar o curso Técnico de Nutrição. Um breve desvio no meu caminho, que ambicionava a faculdade de Letras ou Jornalismo, porém a grana disponível só dava pra um curso técnico. Vislumbrando um salário razoável como nutricionista técnico, o que proporcionaria lá na frente o desejado curso superior, comecei os estudos. Foi bom. O curso era interessante, agradável e focava quase que exclusivamente em algo que adoro, comida. Aprendi muitas coisas legais, fiz estágios bacanas e tive até um bom emprego por um período bem curto, mas não era minha vocação, nunca foi. Meu pensamento estava sempre no sentimento humano e em escrever sobre ele. Era meu hobby de todas as horas, escrever, escrever, escrever.

Naquele ano conheci pessoas que carrego no peito até hoje, uma em especial, Maristela Braga. Vivi momentos de puro tormento na casa em que me hospedava, até após três meses conseguir me livrar de regras idiotas e uma má vontade gigante. Fui morar pela primeira vez verdadeiramente sozinho em um quarto que me dá arrepios de lembrar, ratinhos me faziam companhia frequentemente. Era péssimo? Sim. Mas era o que eu podia pagar. Eram minha rotina, minhas regras, minha independência. E a sensação de ser dono do próprio nariz é maravilhosa, ainda mais eu que sempre fui filho único, super protegido, criado pra sair de casa apenas e somente casado. Vivia algo que sempre desejei internamente desde muito cedo, mas nunca comentei em casa sobre. Saí da redoma de vidro da casa de meus pais sobre protestos e chantagens emocionais, por parte de minha mãe, é claro, porque meu pai nunca ligou muito pra isso, talvez tivesse ficado um pouco triste, mas nunca fez drama. Então estava eu lá, aos 21 anos de idade, morando com ratinhos, tendo como vizinhos de porta: um bêbado que tinha cirrose e todas as noites sofria com uma crise terrível de tosse, me fazendo custar à dormir; uma velha ninfomaníaca que queria transar a todo custo todas as noites com seu velho que já tava praticamente brocha, e não conseguindo saciar seus desejos, desfiava um rosário de xingamentos pra lá de obscenos pro pobre coitado, que morria de vergonha dos vizinhos e ficava em silêncio só ouvindo os desaforos da velha tarada, e um pedreiro que me tentava todas as noites com propostas bem ousadas, tal qual o mecânico de Amor à Vida que não deixa o Félix em paz. Nesse mesmo ano fiz estágio em dois hospitais e consegui ser dispensado dos dois. Me mantinha com inacreditáveis $300 reais, pagava o curso, as passagens e o aluguel. Foram tempos difíceis, mas sobrevivi.

No ano seguinte, 2004, conheci Rafael, Eduardo, Leo e Marcelo, pessoas que me apresentaram a noite Porto Alegrense, pois aos 22 anos eu ainda era um menino bem comportado, não conhecia os prazeres noturnos e otras cositas. Me endividei com o curso. Fui morar com uma gente horrorosa que transformou minha vida num inferno e nesse inferno acabei me libertando, pois aos 23 anos, sem suportar mais tanta maledicência disse à minha mãe com todas as letras o que já era óbvio pro mundo inteiro, mas ela não queria acreditar: "eu sou gay". Tudo finalmente esclarecido depois de duas décadas e um terço, entro na reta final do curso. Faço o estágio curricular. Arranjo emprego no hospital da cidade onde meus pais moram e me vejo obrigado a voltar pra casa deles, que nunca deixou de ser minha. Mas eu queria Porto Alegre, sempre quis. Sou bicho de cidade grande, "urbanóide" cosmopolita e sempre amei Porto Alegre. A capital do meu estado pode não ser a mais linda, mas é apaixonante. Volto contrariado e triste pra cidade de gente fofoqueira e medíocre, pra alegria de minha mãe. Inconformado, aos poucos começo a me adaptar ao trabalho, o que era difícil de engolir era a falta de cinemas, teatros, parques cheios de gente aos domingos, cafeterias, livrarias, gente interessante. Pra compensar tinha o mar, mas mesmo com toda sua imensidão era muito pouco pra mim. O reveillón daquele ano foi um barato, Eduardo e Rafael passaram comigo e fiquei muito amigo de Fernando naquele 31 de dezembro de 2004.

Com a chegada de 2005, sou demitido após o período de experiência, em fevereiro. Fiquei revoltado por ter sido vítima de picuinhas e fofocas, mas empolgado com a possibilidade de voltar à Porto Alegre e conseguir uma colocação lá. Fernando se torna meu melhor amigo, fazemos muitos passeios noturnos pela praia. Ele dorme em casa, eu durmo na casa dele, fazemos planos, tecemos sonhos de um dia sair daquele lugar infrutífero e assim vamos vivendo nossa vidinha pacata, sem grandes acontecimentos, mas nos agarrando um à companhia do outro. Até que por um golpe de sorte meu pai é transferido de seu emprego pra Porto Alegre. Minha alegria não cabia em mim. Voltar à minha amada capital sem precisar passar por todos os perrengues de viver sozinho, era bom demais. Minha mãe não aceitou, sempre odiou cidades grandes com todas as forças, mas dessa vez as circunstâncias eram inquestionáveis, ela teria que aceitar, ou ficaria sozinha naquela praia deserta. Pois a danada não foi. Alegou que esperaria o ano terminar e mudaria no ano seguinte quando tudo estivesse estabilizado. Eu e meu pai partimos em junho. Eu mesmo arrumei tudo, o lugar pra morarmos e todos os detalhes da mudança. Sem pressa de conseguir qualquer emprego pra sobreviver, comecei a procurar calmamente. Meu pai vivia de casa pro trabalho, do trabalho pra casa com saudades da minha mãe. Eu me jogava. Mas o que era bom durou pouco, não sei se foi macumba, pensamento negativo da minha mãe ou apenas azar o meu, mas meu pai foi demitido, o que o fez voltar correndo pra casa na praia, me deixando só novamente. Pra mim era uma questão de honra não voltar, e não voltei. Em dezembro consegui o emprego num restaurante uruguaio e consegui continuar às minhas próprias custas em Porto Alegre. Logo na entrevista conheci Ricardo, aquele que veio a ser um grande amor. Por Ricardo os três meses seguintes foram mágicos, mas depois desse período saí do restaurante, onde conheci também Milena, Cristina, Jonathan, Marise, Alexsandro, Liliana e mais um bocado de gente pra lá de especial, 2006 foi o ano das pessoas especiais, algumas permaneceram outras desvaneceram. 

Do restaurante fui trabalhar em um café colonial, onde conheci meus novos e queridos patrões, que se tornaram amigos do coração, Mara e Paulo. À essa altura eu já não atuava mais como técnico, depois que saí do hospital no litoral, desisti da profissão, resolvi focar no que sempre quis, mas emprego pra garçom e atendente nunca falta e meu currículo chamava a atenção. Então lá fui eu servir mesa por um bom tempo, odiando tudo aquilo com todas as forças, sonhando com meus contos, crônicas, poesias e prosas. O dinheiro nunca dava pra nada além do aluguel, roupa e necessidades pra lá de básicas. Queria e precisava fazer inglês, mas nunca chegava o suficiente, queria guardar um dinheiro no banco pra qualquer eventualidade, mas parecia piada, pagar a faculdade então nem pensar, prestar uma pública não passava pela minha cabeça, nunca fui muito fã de ficar debruçado horas e horas em cima dos livros e nem teria tempo pra isso. Precisava era de grana pra pagar pelo meu sonho. No final do ano, lá por setembro, me demiti. Depois de seis meses não aguentava mais àquela vida improdutiva. Pela primeira vez optei por voltar pra casa dos meus pais, já não tinha mais forças pra tentar a vida em Porto Alegre sozinho, sem a ajuda e o apoio de ninguém. Meus pais viviam a vidinha deles e financeiramente não podiam fazer muito por mim, coitados. Assim voltei e em dezembro daquele ano comecei a trabalhar como temporário no maior mercado da cidade, a rede Wall Mart. Depois de três meses e sem emprego mais uma vez resolvi tentar a sorte em outras paragens. Em março de 2007 mudei-me pra casa de uns parentes em Curitiba. Vivi por lá seis meses, foi uma das piores escolhas que fiz. Lugar chato, sem graça. Tirando os parques cercados de verde e laguinhos por todos os lados, não tinha mais nada de fascinante na cidade. Trabalhei em uma clínica no período que estive por lá, mas foi um dos piores empregos que já tive. Nada fluiu, foi tudo péssimo, exceto a companhia do meu tio Jeovani, uma figura divertidíssima com quem dividi o mesmo teto e muitas gargalhadas, filmes e séries enquanto morei na capital do Paraná.            

Em outubro daquele ano, retornei ao litoral do RS, e foi um dos momentos mais maravilhosos da minha vida. Sair de Curitiba e voltar pra minha terra foi uma sensação indescritivelmente agradável, até o céu da cidade parecia mais bonito, mais azul. Novamente trabalhei no Wall Mart naquele fim de ano, dessa vez com a promessa de uma efetivação, o que no fundo eu desejei. Já estava cansado de viver sozinho em Porto Alegre e batalhar sem resultados, longe do conforto de casa. Então me resignei e decidi ficar no interior com meus pais por tempo indeterminado, mesmo tendo a certeza de que meus sonhos jamais seriam realizados ali. Mas o trauma de minha passagem por Curitiba me fez mudar alguns conceitos. Aceitar que não adiantava dar murro em ponta de faca , o que tivesse de ser, seria.

Com o término da temporada de verão em 2008, minha efetivação não veio e fui dispensado do hipermercado. Tive uma ligeira decepção, que demorou pouco a passar. Logo estava eu de novo fazendo planos para sair daquela cidade insuportável. Nesta última temporada de Wall Mart me relacionei com pessoas incríveis: Rodrigo, Carine e Bruna foram os principais. Em março eu estava de volta à Porto Alegre, mas dessa vez eu estava diferente, mais maduro, mais consciente, mais feliz. Fiquei hospedado por um mês na casa de Verônica e Sheila, duas amigas que se mostraram uma bênção na minha vida, mas logo senti necessidade da minha privacidade e liberdade. Aluguei uma kitnet no centro da cidade, perto do meu trabalho, uma cafeteria argentina em um dos bairros nobres da cidade. O café era um sonho, mas o trabalho, depois de um tempo tornou-se um pesadelo. Nesse ínterim conheci pessoas e vivi momentos que fizeram àquele ano ser um dos mais memoráveis pra mim. Murilo se tornou meu grande amigo. Depois seu namorado, João. Carine me visitou algumas vezes. Bruna também mudou-se pra Poa. Rita foi um acontecimento na minha vida. E pra fechar o ano tive o privilégio de conhecer Bianca e Lauren, duas queridas, que me fizeram lançar um novo olhar pra vários ângulos da vida. Em dezembro me demiti da cafeteria argentina, pra assumir a sub-gerência de um café num cinema de shopping. Promessa de um emprego maravilhoso que não durou um mês.

No início de 2009, vivi uma das piores faces da minha vida. Desempregado e sem um centavo no bolso, tive que me virar nos 30 pra não passar fome. Um detalhe de 2008 muito importante, que esqueci de comentar, meus pais se pararam e foi um baque que me detonou emocionalmente, estragando grande parte das conquistas que tinha alcançado até aquele momento. Minha mãe veio morar comigo e foi desastroso. Nesse período de 2009 ela estava viajando quando passei pelo perrengue de ficar sem grana e sem trabalho e só quando não dava mais foi que liguei pedindo pra que ela voltasse com urgência. Com sua volta, uma nova ideia brotou na minha cabeça cansada de tantos lutas sem sucesso. Eu queria sair de Porto Alegre, mas dessa vez em definitivo, pra um lugar promissor onde a possibilidade de retorno não me tentasse. Troquei muitas mensagens com uma amiga que estava em Portugal e cogitei a possibilidade de sair do Brasil, mas diante das implicações burocráticas e da grana que não seria pouca, descartei. Até que veio a ideia mais óbvia que eu nunca havia tido, tentar a sorte em São Paulo. Depois de mais uma tentativa frustrada de trabalhar num bistrô, por uma semana, em maio parti pra terra da garoa. Sem ter a mínima ideia do que faria por lá, mas cheio de boas expectativas. Se não desse certo em São Paulo, não daria mais em lugar nenhum, esse era meu pensamento, e não errei. Quando cheguei por aqui me adaptei de imediato. Passei 10 meses e fui obrigado a retornar ao Sul por problemas de documentação. Voltei, mas parti determinado a resolver minhas pendências no RS e retornar a SP assim que tudo estivesse sanado. 

Em março de 2010, estava morando novamente com minha mãe, que ainda estava separada do meu pai, numa cidade chamada Capão da Canoa. Não era mais aquela cidade horrorosa que nem gosto de citar o nome, mas também era praia e bem pequena. Voltei triste, com o coração partido, pois tinha me apaixonado por São Paulo, mas aquele um ano e três meses que vivi em Capão da Canoa com minha mãe foi um dos melhores da minha vida. Ali descobri e conheci tanta coisa e tanta gente, mas principalmente me conheci como nunca antes. Fiz profundos mergulhos dentro de mim e da minha personalidade ao mesmo tempo que fazia planos pra uma volta triunfal e definitiva pra Sampa. Sem contar nos momentos mágicos íntimos e familiares com minha mãe, nossa relação atingiu um outro patamar à partir daquela fase. Em agosto voltei a trabalhar no Wall Mart, acreditem se quiser, mas ali era uma das melhores opções de emprego, e não tenham dúvida que trabalhar lá é uma das piores coisas do mundo. Fiquei 8 meses e me demiti. Um mês e meio depois, após me despedir dos amigos queridos que ali fiz: Luísa, Daniel, Robson, Jennifer, Vagner, entre outros, voei de volta pra São Paulo. Onde cheguei no dia 19 de junho de 2011.

Desde então vivo aqui nessa cidade, que pra mim é a maravilhosa, até porque ainda não conheço a outra. E nesses dois anos e meio que aqui me encontro não parei de ralar, batalhar e correr atrás, como sempre fiz, só que com uma grande diferença, sinto uma evolução nos meus esforços como antes não sentia, e tudo aqui me empolga, me impulsiona e me surpreende o tempo todo.

Nesse ano de 2013, em que fazem 10 anos da minha longa estrada solitária, finalmente consegui ingressar na universidade. Foram necessários 10 longos anos pra isso e muita perseverança, mas tô aqui. E eu não vou olhar pra trás com tristeza por não ter conseguido isso antes, por teoricamente, ter perdido tempo demais. Não perdi, ganhei. Fiquei amadurecido e sábio de coração. Não serei hipócrita de dizer que não preferia ter entrado muito antes, preferia sim. Mas foi assim que as coisas se sucederam comigo. E no meio de tantas pessoas imaturas e perdidas dentro de uma universidade, que agora eu vejo que tem muitas, que estudam e dividem comigo os bancos escolares, me sinto pleno de minhas vontades e desejos e cheio de uma certeza absoluta daquilo que quero e de onde quero chegar. E nesse ano de conquistas especiais andei ao lado de gente muito bacana. Foi o ano que conheci Celinha (Regina), Inácio Lisboa, Vânia, Valquíria, Carol Dias, Vanessa, Camila, Christiane, a criativa Jennifer, Denise, uma professora mágica de literatura, a Marcinha, o professor Murilo, uma grande inspiração e a dedicada professora Adriana. 

Tive a companhia agradável de minha amiga Luli, em vários jantares deliciosos em seu Ap. A vinda de Daniel pra São Paulo, mais uma vez, que resultou em muitos momentos legais de conversas, confidências e até desentendimentos. Passei a admirar cada vez mais meu colega de Ap., Alisson. Estreitei amizade com o sensacional Renato, um poço de papos-cabeça infindável. Também Maíra, uma louca adorável. Os amigos de sempre também estiveram presentes, João e Said, sempre agregando. Assisti filmes ótimos. Vi peças incríveis. Participei de eventos sensacionais. Li livros bons e ruins. Odiei meu trabalho mais do que nunca. Chorei a morte de uma pessoa querida que jamais poderia imaginar que partiria tão cedo. Tive momentos de terríveis angústias. Comecei a exercitar minha veia de escritor, crítico e resenhista pra um público maior, no super acessado blogue de entretenimento cultural Pop de Botequim, e isso me fez muito bem. E num apanhado geral, 2013 valeu muito à pena e pra que não reste qualquer dúvida de que 2014 promete, termino o ano com a promessa de um novo amor. Complicado e delicado, mas qual a graça do amor sem sua pitada de dificuldade.

"Valeu à pena. Sou pescador de ilusões!"      

sábado, 28 de dezembro de 2013

IRONIA





Eu não sei o que eu tô fazendo

Eu não sei o que eu tô pensando

Mas seria irônico se você me esquecesse

E eu acabasse me apaixonando.

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

EI, MENINO!


Ei, menino! Por que a gente não se apaixona por quem se apaixona pela gente? Você disse que estava apaixonado por mim. Eu disse que não. Aí você voltou atrás, disse que também não estava mais.

Eu poderia me apaixonar por você, menino, mas agora tenho medo! Você sente rápido demais, põe os pés pelas mãos, se declara, pra pouco tempo depois se desmentir. Você é carente ao extremo, desastrado, hiperativo, distraído e menino. Tão menino! Mas foi o primeiro que me olhou com paixão, e isso mexeu comigo, mesmo você sendo tão menino.

Eu tenho 30, você 19. 

Sou ponderado, calmo, gosto de respirar e falar devagar, pausadamente. Você é elétrico, impaciente, atropela as palavras e fala pelos cotovelos. Somos tão diferentes, menino! E não sei se nesse caso os opostos se atraem. O que sei é que já te dei todos os motivos pra não termos um relacionamento e você pareceu concordar, mas as vezes acho que concordou apenas pra não se magoar. Quando tô perto de você sinto que alguma coisa dentro de ti me ama e me deseja de alguma maneira e isso me faz ter vontade de te amar também.

É aquela vontade de gostar de quem gosta da gente, retribuir o sentimento à altura. Mas, é tão difícil!

O fato é que te amo, menino! Mas parece fraterno, amor de pai, de irmão mais velho. Vontade de proteger, te guiar pelo melhor caminho, aconselhar, dar colo. Mas também desejo alguém que me proteja e não sei se você seria capaz de suprir tantas necessidades emocionais que habitam minha mente e meu coração. Você é só um menino, não deve se sobrecarregar com as carências de um homem de 30.

Ei, menino! Também tem a questão da libido. Se o que você sente por mim e o que eu sinto por você for só fraternal, não existe desejo sexual. Embora eu tenha sentido vontade de te beijar e a última vez que nos vimos achei que ia rolar, não o sexo, mas o beijo, as carícias, uma intimidade maior, mas você parecia que já tinha desistido de mim. E mesmo que o sexo não seja a coisa mais importante pra formação de um casal, e eu realmente acho que não é, alguma faísca tem que existir, você sabe, menino. Claro que você sabe. No vigor dos seus 19 anos suas faíscas estão crepitantes. As minhas é que já não andam lá essas coisas. Aí me pergunto: o ideal não seria um cara da minha idade, ou mais velho? Pra acompanhar o meu pique, que já não está tão pululante assim?

Ai, menino, ultimamente você tem me feito pensar tantas coisas. Não tô conseguindo simplesmente deixar acontecer, como tantos já me aconselharam. Achei que você era só um menino meio maluco e totalmente carente, que não significaria nada pra mim, mas você tem se feito presente todos os dias de alguma forma, até quando não liga ou deixa algum recado você tá sempre lá em algum cantinho da minha cabeça, me fazendo lembrar com uma felicidade inconfessa que existe alguém que gosta de mim, não como filho, amigo, colega, mas como homem, como ninguém nunca gostou, pelo menos não declaradamente. E nessas horas me sinto tão bobo, mais menino que você.

Normal sentir assim, afinal, sempre amei sem ser correspondido. E agora diante de você, da possibilidade do teu amor, eu temo. 

Estás longe de ser o homem que sonhei, mas pro inferno essa maldita idealização, relacionamento é construção. Mas não seria leviano da minha parte aceitar teu amor só porque és o primeiro que o declara com todas as letras? Você merece alguém que te ame muito, com paixão, com loucura. 

Você merece, menino! Porque você é bom, humano, generoso, inteligente, batalhador, trabalhador, engajado, inconformado, engraçado, divertido, puro, ingênuo, sonhador. Você é admirável e por isso eu posso vir a te amar, porque eu reconheço todas essas qualidades em você e até teus defeitos me parecem hilários e facilmente contornáveis. E também, porque eu tenho sentido saudade de você, da tua voz, do teu jeito, saudade de uma coisa que a gente ainda não viveu, quando eu acordo, quando saio pro trabalho, quando volto do trabalho. Ontem eu fiquei melancólico pensando em você, em como é bom saber que você gosta de mim de um jeito especial, mas talvez não conseguir corresponder. Ou começar a corresponder e ser tarde demais, você se desinteressar.

Ei, menino! Será que pode dar certo?

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

POEIRA DE ESTRELA



Refaço trajetos, lembranças, reviro o baú de memórias, na esperança de te reencontrar.

Fico parado na estação do metrô onde trocamos as primeiras palavras, palavras que me fizeram tiritar por dentro, mas eu não demonstrei, mantendo meu ar blasé. Fico parado ali na esperança de reviver aquelas sensações todas, mas não acontece, você não está ali.

Volto à rua numa noite escura, rua em que caminhávamos juntos todos os dias voltando do trabalho. Você sempre chegava em casa antes, mas fazia questão de me levar até à esquina. Refaço nossos passos, olho tua antiga e velha casa e controlo a vontade flamejante de bater na porta esperando ansioso você vir abrir. Você não virá.

Revivo insistentemente o momento mais terno de nós dois, você me acompanhando cuidadoso e cauteloso até o médico, depois que passei mal no trabalho. Nos meus sonhos mais doces você segurava minha mão. Fecho os olhos bem forte pra sentir seu toque, mas é inútil. Você nunca segurou a minha mão.

Seu sorriso dança nos meus pensamentos. Os olhos matreiros por trás das lentes discretas me absorvem. Até as feiosas entradas se tornam irresistivelmente charmosas. Lembro da tua frieza, tua dificuldade de amar e principalmente de ser amado. Teu medo do meu sentimento. 

Aperto o play da minha memória e ouço de novo tuas confissões, me contando que já recebeu dinheiro por sexo; que já tinha experimentado várias drogas, mas era só usuário de maconha; a forma como usava as pessoas pra obter prazer sem sentir um pingo de culpa e me dizendo com jeito de menino arrependido que não valia nada, que era um puto inconteste. Era como um aviso: eu não valho à pena!

E eu queria me convencer disso, deixar de sentir essa coisa profunda, amável e apaixonante que eu sentia por ti, mas não saía de mim. E o resultado foi um coração partido mais uma vez, não por falta de aviso, mas por falta de consumação. Talvez eu não tivesse me importado de sofrer se você não tivesse sido só um sonho, uma ilusão. Eu seria feliz apenas com as lembranças, se elas não fossem só conjecturas.

Você me deu muito pouco, e fiz desse pouco uma imensidão. Hoje revisito minhas memórias, refaço nossos poucos caminhos, volto àquela estação, à rua, ao hospital. Sua imagem é miragem, neblina onde mergulho e me perco na imensidão utópica dos meus devaneios, me arrasto, me debato, me martirizo, porque agora e pra sempre não tem mais jeito, você será apenas memória.   

sábado, 23 de novembro de 2013

RECORDAÇÕES DE UM CRIME



Beijou-lhe os lábios. Ofereceu-lhe uma coca-cola. Pediu pra que passasse aquela tarde com ele. Confuso, com os olhos arregalados e o coração acelerado como uma batucada de tambores, não sabia o que pensar. O homem tinha mais de 40 anos. Seu pai saiu do banheiro. Ficou tentado com a proposta, mas preferiu voltar pra casa com o pai. Estava excitado e nervoso. No caminho de volta pra casa, lembrava das sensações, da forma como havia sido tocado. Era assustador, era bom. O homem estava debilitado, à pouco tempo havia perdido a visão. Os familiares não gostavam de deixá-lo só em casa, por isso sempre arranjavam alguém pra fazer-lhe companhia. Quando ele o tocou daquele jeito não parecia cego. Naquela tarde o pai queria deixar-lhe fazendo companhia ao velho amigo que não estava enxergando. Ele teve medo, apesar do frêmito de excitação e da curiosidade. Na cama, enquanto tentava pegar no sono, se inquietava relembrando a surrealidade daquela situação. Passou os dias ansioso por encontrar-lhe de novo. Será que ele o beijaria novamente? Será que estaria apaixonado? Como poderia ser, era um homem casado? Achava-a querida, gostava dela. O que estava acontecendo? Por que ele tinha feito aquilo? Precisava de respostas. Da segunda vez que ficaram sozinhos propôs-lhe uma brincadeira. Pediu que fechasse os olhos. Foi até a geladeira, pegou um pote de goiabada e disse para manter os olhos bem fechados. Abriu o zíper da calça, colocou o pênis pra fora e com o membro rijo em direção a sua boca jovem, macia e rosada, exalando o puro frescor da inocência, mandou-o que lambesse suavemente com a ponta da língua e sem abrir os olhos em hipótese alguma, o doce que ele teria que descobrir qual era apenas pelo paladar. Aproximou a língua com receio da glande à sua frente. O sabor azedo não lhe lembrava doce algum. Sentiu-se ludibriado e abriu os olhos. O homem recompôs-se ligeiramente, mostrando-lhe o doce de goiaba. O gosto que tinha sentido nada tinha a ver com goiabada, ficou confuso. O homem percebendo sua desconfiança e desconforto, não tentou mais nada naquele dia. Noutra ocasião, em um almoço de domingo, as famílias se reuniram. Após a refeição o homem recolheu-se. Ele também sentiu vontade de tirar um cochilo. A esposa disse-lhe que se deitasse com seu marido. Na cama do casal, o homem recostou-se em posição fetal atrás dele e friccionou em movimentos crescentes seu membro, pedindo que ele o tocasse. Virou-se de frente pro homem e quando tocou seu sexo duro ficou admirado, nunca tinha visto daquele tamanho. Estava excitado como nunca antes. Suas mãos pequenas e macias faziam movimentos de vai e vem que deixavam o homem atordoado de prazer. Explodiu num gozo farto e silencioso enquanto as pessoas na sala assistiam televisão. Mais uma surpresa, mais um susto. Imaginou que tivesse machucado o homem, que se esvaía em sangue, um sangue branco e viscoso que ensopava a cama inteira e que ele nunca tinha visto igual. Quis saber o que era. Leitinho quente feito especialmente pra ele, disse-lhe o homem, mandando-lhe experimentar. Ele não quis. Achou estranho. Sentiu um pouco de nojo. O homem começou a tocá-lo depois. Teve seu primeiro orgasmo, mas o leite não saiu. Quando percebeu que ele tinha atingido o clímax, sussurrou no ouvido do menino de 7 anos, que aquele seria um segredo só deles.  

terça-feira, 12 de novembro de 2013

É IMPOSSÍVEL SER FELIZ SOZINHO?





Acordou às 7. Tomou dois goles ligeiros de café preto. Fez sua corrida matinal aos arredores do parque que tinha em frente ao seu apartamento. Voltou pra casa suado, como de costume. Tomou uma ducha fria. Preparou uma caprichada mesa pra fazer sua primeira refeição: pão fresco, suco natural feito na hora, queijo, patês e morangos, adorava morangos pela manhã. Antes de pegar no batente, àquele ritual era sagrado. Um pequeno prazer matinal que enchia de satisfação o corpo e a alma.


Enquanto tomava o café e apreciava a belíssima vista verdejante que o parque proporcionava da janela de sua sala, no som ouvia Wave. Adorava a canção de Tom Jobim, mas quando chegava na parte em que ele entoa que "é impossível ser feliz sozinho", emitia um silencioso sorriso de desdém. Era um homem solitário, talvez por opção. Gostava da solidão auto-imposta e não se sentia infeliz em absoluto.

Às 9 trancou-se no escritório. Tinha acabado de ser contratado por uma editora e estava às voltas com um novo romance. Enquanto escrevia, sentiu Barbarella ronronar e enroscar-se em suas pernas pedindo comida. Interrompeu o terceiro capítulo na metade para encher o pote da gata angorá cinza, de ração.

Ao meio-dia fez uma pausa pro almoço. Colocou no forno a lasanha congelada de legumes. Serviu-se de uma taça de chardonnay e saboreou sua refeição pensando na proposta que recebera de uma emissora de tv pra roteirizar um seriado. Estava empolgado com a ideia, mas nervoso, seu objetivo era a televisão, a grande massa, queria levar um pouco de entretenimento inteligente para o povo, e as coisas estavam acontecendo como ele sonhara, sem falar no salário de um roteirista de televisão, que era uma fábula. Não poderia estar mais feliz. As coisas se encaminhara, depois de tantos percalços sua vida estava nos trilhos. Morava em um lugar que imaginara meticulosamente, trabalhava com o que mais amava, tinha Barbarella e sua abençoada solidão.

Após o almoço voltou à ativa, precisava terminar o terceiro capítulo. Às 18 horas, encerrou as atividades do dia. Encontrou-se com os diretores da emissora em um piano-bar às 19:45, pra conversar sobre o seriado e o contrato que estava prestes a assinar. Ao som de Billy Holliday e Nina Simone, tudo correu às mil maravilhas, saiu do piano-bar com mais um contrato assinado. Estava feliz como nunca. Recebeu um telefonema da mãe que estava em Aspen, esquiando - presente dado por ele em comemoração aos seus 60 anos - e contou a notícia quentinha, recebida pela mãe com grande estardalhaço. Sua mãe era seu tudo, esteve sempre ao seu lado fazendo o impossível para que realizasse seus sonhos de criança. Era a única amiga de verdade que tinha na vida.

Precisava comemorar sua recente conquista, não cabia em si de alegria. Saiu pra dançar, extravasar. Bebeu, dançou, beijou. Terminou a noite entre lençóis de cetim em um motel. Não trocou telefone, saiu antes, pagou a conta, apesar da insistência do outro pelo número dele, pra que saíssem juntos e pra que deixasse a conta pra ele pagar. Não queria vínculos, apenas uma noite, uma comemoração. Havia desistido dessas tentativas de relacionamento pós balada há tempos. Essa coisa de amor, deixava como inspiração apenas pra seus romances, já havia chegado à idade da razão. Romances em sua vida? Não precisava deles, definitivamente, apenas em seus livros.

Já em casa, após um banho relaxante, observava nu, encostado em sua janela no décimo andar a serenidade da noite. Eram quase 5 da manhã, e o clarão da lua iluminava o quarto, refletindo sob a escrivaninha um porta-retrato, ele e mais cinco amigos com uma cachoeira ao fundo. O último encontro, antes que cada um seguisse seu caminho na vida. Depois daquele encontro nunca mais se viram, trocaram alguns telefonemas, e-mails, mas o contato foi se esvaindo com o tempo. Ele gostaria de voltar ao passado às vezes, mas logo pensava que era sentimentalismo bobo. Afinal era feliz. Feliz sozinho!     

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

O BEIJO





Andei pensando esses dias sobre um assunto que já deu o que tinha que dar, o famigerado beijo gay. Nunca me pronunciei sobre o assunto por pura preguiça, foi tão falado, debatido, reivindicado que cansou minha beleza. Eu realmente não achava primordial que rolasse um beijo entre personagens gays apaixonados em uma novela, embora acharia muito legal se acontecesse. Porém, penso que não são todas as tramas envolvendo casais do mesmo sexo que pedem que o romance seja selado com um beijo apaixonado. O beijo não deve ser inserido de qualquer maneira, só pra ser esfregado na cara de telespectadores incautos e preconceituosos. Tem que ter todo um histórico romântico, tipo amor impossível, que ao final, depois de todos os percalços brinda-se com a cereja do bolo, o beijo.


Por que pensei nisso agora?

Três fatores me levaram a escrever esse texto: o final de Sangue Bom, novela das sete que terminou semana passada; uma entrevista do novelista Sílvio de Abreu pra um canal virtual e o selinho trocado entre dois homens no programa Amor e Sexo da última quinta-feira (07).

Na novela, formou-se no último capítulo três casais gays, dois masculinos e um feminino e obviamente não houve beijo de nenhum dos três, mas a história que se desenhou durante a trama, envolvendo os personagens Filipinho e Xande foi delineada de tal maneira, que a troca de um beijo entre os dois seria muito legal de se ver. Foi tudo extremamente discreto e quase velado entre os dois, tanto que um telespectador menos atento mal perceberia que os personagens tinham algo além de pura amizade. A história: Filipinho era um garoto sensível e delicado que ainda não se descobrira gay e Xande, um rapaz hétero de caráter meio duvidoso, que nunca perdia a oportunidade de fazer bulliyng com Filipinho. Com o decorrer da trama percebemos que Filipinho gosta de Xande, esse porém namora garotas. A amizade entre os dois se estreita e Xande, antes um oportunista, começa a se tornar uma pessoa melhor influenciado por Filipinho, que por sua vez passa por diversos problemas pra aceitar e assumir sua sexualidade e acaba deixando de lado o sentimento por Xande, acreditando que como hétero ele jamais o corresponderá. Após resolver suas questões e aceitar-se como é, Filipinho reencontra Xande e se surpreende com uma declaração apaixonada do cara de quem gostou o tempo todo. Diferentemente da trama anterior de Maria Adelaide Amaral e Vincent Villari, TiTiTi, onde o casal gay mais lindo da tele-dramaturgia, Julinho e Talles,trocavam muitos carinhos e demonstravam grande paixão, Filipinho e Xande formaram um casal insípido, sem conflitos pra assumirem seu amor e zero demonstração de estarem apaixonados, portanto, mereciam dar ao público que torceu por eles um fechamento digno e emocionante, selando a união com um beijo rápido, simples e sem alardes, coerente com o comportamento de ambos durante toda a trama. E também diferentemente de Talles e Julinho, que já demonstravam tanto amor que um beijo não faria diferença, eu quis ver um beijo entre Xande e Filipinho, me fez falta como nunca em outras novelas.

Aí, depois do falastrão Aguinaldo Silva dizer que o tal beijo nunca vai aparecer em nenhuma novela, que não precisa e coisa e tal, assisto uma rápida entrevista com Sílvio de Abreu afirmando o mesmo, que é uma bobagem, que não tem necessidade, que o público não quer ver e blá blá blá. Que é uma bobagem a discussão em torno disso, até concordo, que é desnecessário, pode até ser, mas que o público não quer ver, pera lá cara pálida! Que público que não quer ver? A grande maioria conservadora, preconceituosa e hipócrita? Ok! Mas, e a outra fatia do público? O gay que é louco por uma boa novela, e quase todos são (eu me incluo nessa)? As gentes descoladas, esclarecidas, cabeça aberta? Esse público existe, mesmo sendo em número menor e se dividem entre os que querem ver sim e os que não dão a mínima importância com uma cena de beijo entre iguais. E penso que como detentores de uma parte da audiência também deveriam ser respeitados em seu desejo assim como a maioria. Ou alguém imagina uma novela inteira sem ao menos um beijo trocado entre o casal protagonista? E se o beijo hétero aborrecesse e ferisse os valores dos telespectadores gays? Dane-se né, é apenas uma minoria. Pra mim é apenas uma questão de respeito, e esse sim precisa ser forçado.

Aí, pra mostrar que não é nada preconceituosa (e eu acho que não é mesmo, é tudo apenas uma questão de manter as aparências), vem a Globo e mete um selinho gay, sem quê nem mais, depois da meia-noite no Amor e Sexo de Fernanda Lima. Sem história, sem contexto, sem nada, só pra mostrar que aceita todas as formas de amor. Mas não é isso, não é simplesmente ver um beijo gay na Rede Globo de Televisão que nós queremos. Isso eu vejo na boate, nos filmes. Queremos que esse público conservador veja e encare com naturalidade, como encaram o beijo do casal protagonista, sem medo nem dor, sem asco nem pavor,apenas mais uma dentre tantas demonstrações de amor, e isso só vai acontecer quando formos representados por um beijo de novela.   

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

A ÚLTIMA GOTA DE "SANGUE BOM"





Foram 160 capítulos, acompanhados religiosamente desde o primeiro, exibido em 29 de abril. Sangue Bom foi a melhor novela do ano pra mim. Como numa orquestra, meus queridos autores Maria Adelaide Amaral e Vincent Villari, regeram magistralmente uma história engraçada, crítica, dramática e romântica com um texto típico para o horário das sete da noite, ácido e irônico, porém "soft".






Sangue Bom foi uma novela sem barriga, facílima de ser acompanhada, sem enrolações. Tudo muito bem costurado, com personagens carismáticos, feitos sob medida pra fisgar o coração e a simpatia ou antipatia do público. Sempre vai ter quem torça o nariz e diga que a novela não foi tudo isso, mas Sangue Bom tinha um astral tão bom, uma harmonia perfeita, como eu gosto de ver em novelas. Pra mim tudo funcionava, os cenários coloridos e luminosos, os diálogos afiadíssimos, os ganchos, a trilha sonora e a metalinguagem sempre tão presente e extremamente divertida. Esses dois últimos, aliás, foram ingredientes fundamentais.



Vimos em Sangue Bom as mais diversas referências aos programas da emissora, principalmente à outras novelas de grande sucesso como Cheias de Charme, Senhora do Destino e Avenida Brasil, com essa última, aliás, os autores deitaram e rolaram. Na figura de Tina (Íngrid Guimarães), eles fizeram uma grande homenagem a recentemente finalizada trama de João Emanuel Carneiro, um sucesso incontestável do ano passado que em sua versão satirizada nos fez dar muitas gargalhadas. Íngrid Guimarães se esbaldou com sua tresloucada Tina e foi à forra em cima de Bárbara Ellen (Giulia Gam em mais um momento brilhante). Uma das cenas mais deleitosas envolvendo as inimigas Tina e Bárbara foi quando dentro da própria sátira de Avenida Brasil os autores satirizaram outra memorável novela, Vale Tudo de Gilberto Braga. Em um devaneio, Tina pega uma arma dentro da gaveta do criado-mudo e ao ver o vulto de Bárbara se arrumando dentro do closet ela atira através da porta, estilhaçando-a com três tiros e assassinando Bárbara Ellen, fazendo-nos rememorar a clássica cena do assassinato de Odete Roitman (Beatriz Segal) cometido por Leila (Cássia Kiss). Nesse momento, a sensação era de que estava assistindo três novelas em uma. Vincent e Adelaide conseguem fazer essas junções com maestria.





A trilha sonora não podia ser mais apropriada, jovem, clássica, romântica e moderna, casava perfeitamente com cada momento em que era executada. Os acordes de "Toda forma de amor", tema de abertura que é um hino, um mantra, uma ode ao amor, a liberdae e a tolerância, "Janeiro à janeiro", "Poema", "Calma aí", "Jacarandá", "Zoião" e "Exagerado" sempre que tocavam pra seus respectivos personagens Amora e Bento, Rosemere e Perácio, Renata, Malu, Fabinho e Tina e Damáris eram sempre perfeitos. Tina e Damáris, além de dividir o mesmo tema musical, também compartilhavam da mesma loucura, às vezes era difícil saber quem era mais louca e mais apaixonante, na dúvida dou empate técnico, ambas estiveram esplendorosas com suas personagens cômicas, malucas e exageradas. Mas voltando as trilhas, Sangue Bom lançou 3 cd's, dois com as músicas nacionais e o terceiro com os temas internacionais, onde se destacaram "Guardian" na voz doce de Alanis Morissette para a igualmente doce Verônica de Letícia Sabatella, que sempre serena, ponderada e amável, pareceu-me interpretar alguém muito próxima de sua personalidade real. A deliciosa "Ho Hey" de The Lumineers para Bento e Amora; a linda "Some Nights" (Fun) como tema geral; "Home" (Phillip Phillips) embalando o amor entre tapas e beijos de Giane e Fabinho; "Feel So Close" (Calvin Harris) para os delírios de consumo de Amora; a regravação de Jesuton para "Because You Loved Me", tema romântico de Charlene e Wilson e a sensual "Madness" do Muse, dando um toque de sofisticação à toda a trama. Tudo de encher os ouvidos e a alma.






O elenco também foi um achado. O sexteto de protagonistas bem jovens, fez bonito e não deixou a peteca cair. No início, antes da estreia, me incomodou um pouco, lembrando demais um núcleo de Malhação, em especial Sophie Charlotte e Marco Pigossi que haviam saído de trabalhos recentes muito marcantes e também como um casal em Fina Estampa, me fizeram esquecer completamente seus personagens anteriores nos primeiros instantes que apareceram em cena como o bondoso e generoso, Bento de Jesus e a ex-menina de rua de caráter duvidoso que se tornou uma famosa it-girl, Amora Campana. Fernanda Vasconcelos, apesar de não ser minha atriz predileta, fez uma Malu correta, íntegra e cativante, bem como Jayme Matarazzo, que mostrou um nítido amadurecimento na pele de Maurício Vásquez, apesar do eterno rostinho de menino frágil, defendeu com verdade seu sincero e transparente personagem. Sem falar na minha dupla preferida, a "maloqueira", esquentada e leal Giane, feita pela linda e talentosa Isabelle Drummond, que num processo gradativo de transformação passou de uma garota sem vaidade, platonicamente apaixonada por Bento à charmosa e cobiçada modelo de campanhas publicitárias e aspirante a fotógrafa disputada por dois caras lindos, sendo um deles o sexto elemento desse grupo de protagonistas, o meu sonho de consumo Humberto Carrão, que arrasou como o detestável Fabinho Queiroz do início da história trilhando um caminho tortuoso até acabar rico, redimido e regenerado ao lado de seu grande amor, Giane. A única coisa difícil de engolir nessa história toda, foi um detalhe que passou batido pelos autores e na minha opinião foi um erro crasso. Fabinho era um bandido no início da trama e pra conseguir seus objetivos cometeu diversos delitos, entre eles roubar uma moto e falsificar um diploma de publicitário, o que lhe possibilitou estagiar na grande e badalada agência de Natan Vásquez (Bruno Garcia), onde ele mostrou que tinha talento, porém ele nunca estudou nem muito menos se formou em publicidade. Os autores passaram por cima desse fato que não é pouca coisa e simplesmente transformaram Fabinho em dono de sua própria agência como sócio de Érico (Armando Babaioff). Como assim, Brasil? Bem, apesar de não ser um erro bobo, relevemos, afinal em novelas quase sempre lança-se mão da licença poética, que existiu também em Avenida Brasil, no episódio do pen drive de Nina que nunca existiu e nem por isso a trama perdeu seu brilho, além do mais sigamos o conselho da sábia Glória Perez "é preciso voar". E foi tão bom voar com Sangue Bom!






Entre o extenso elenco presente nesse mimo das sete, brilharam todos de forma quase imparcial. Em meio a coadjuvantes novos e veteranos, destaque especial tiveram Malu Mader, num papel menor do que merecia, mas digno de seu talento e carisma onipresente, Malu ainda é diva e sempre será, sua Rosemere foi um bálsamo e uma felicidade diária para os fãs apaixonados como eu, mas só voltará a ter um papel à altura da musa que é quando voltar a trabalhar com seu outro eterno apaixonado Gilberto Braga. No papel de seu filho Filipinho, o novato Josafá Filho, em sua segunda novela, também se destacou, protagonizando um debate interessante sobre assumir a sexualidade em meio ao circo da mídia ou omitir sua real condição pra manter as aparências diante de um público que espera uma postura contrária à sua verdadeira essência. Yoná Magalhães á muitos anos sem ganhar um bom papel, desde Paraíso Tropical em 2007, defendeu sua sofrida Glória com toda a elegância peculiar à uma dama da tv. Ellen Roche, cheia de carisma e simpatia transformou a mulher-mangaba, Brunetty, que tinha tudo pra cair na vulgaridade, numa figura tão doce quanto seu apelido, quase infantil e carente e reiterou meu carinho por essa mulher exuberante, linda, gostosa e boa atriz também. Marisa Orth me ganhou de vez com Damáris, ela é engraçada da cabeça aos pés, até sem querer, e construiu uma personagem detestável, cheia de preconceitos, hipócrita, reprimida, recalcada e totalmente adorável, tarefa difícil que não é pra qualquer um e La Orth fez com os pés nas costas. Seu partner, Joaquim Lopez, também não fez feio, pelo contrário, foi uma grata surpresa, Lucindo era real, quase palpável, um cafajeste de primeira ou de quinta, mas com um "borogodó" e um coração gigantes, com jeito de malandro e cara de safado irresistíveis, acho que foi a grande revelação da novela. Teve também a ruivinha Bia Arantes como Cléo, um papel modesto, mas sempre que aparecia enchia a tela com seus cabelos cor de fogo e sua pele cor de leite. E a divina-maravilhosa Carmen Verônica, roubando todas as cenas em que aparecia na pele da esperta milionária Karmita Lancaster, que entrou na história pra fazer alguns capítulos e acabou ficando até o fim tamanho o apelo popular de sua personagem, sempre com um conselho oportuno, uma palavra ou um causo contado na hora certa. Não posso deixar de citar também a iluminada Andréia Horta, atriz que amo de paixão e teve uma importância fundamental na história, mesmo entrando na reta final, para promover a redenção de sua irmã Amora, protagonizando uma das mais tristes e emocionantes cenas da novela.






Como já disse, muitos brilharam nesse elenco estelar, mas citar todos deixaria o post longo demais e eu já tô me despedindo, com a certeza de que uma nova novela que vai me dar vontade de não perder nenhum capítulo e me fazer sentir como se fizesse parte daquele universo, vai demorar um pouco pra estrear novamente. Até lá fica a lembrança boa de uma história tão especial e a saudade! 



                                                  FIM
   

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

A SINGELA POESIA DO DIA-A-DIA



e a felicidade pode ser grande ou pequena
a alegria avassaladora ou ingênua
a plenitude pode estar no olhar

em meio ao caos urbano
buzina e zoeira
pode-se deparar com amoreiras e pitangueiras

fruta comida do pé

entre a doçura das amoras e a acidez das pitangas
recordações da infância 
nostalgia da cidade do interior
da pele macia de criança

pitangas são mais comportadas
amoras mancham indiscriminadas

cuidado pra não sujar a blusa branca
vontade de lambuzar a cara, a alma
mas controla-se numa alegria contida embaixo da árvore frutífera
porém, as mãos roxas denunciam para os passageiros do metrô
a pequena felicidade
a ingênua alegria 
que naquele dia se fez poesia