terça-feira, 10 de dezembro de 2013

POEIRA DE ESTRELA



Refaço trajetos, lembranças, reviro o baú de memórias, na esperança de te reencontrar.

Fico parado na estação do metrô onde trocamos as primeiras palavras, palavras que me fizeram tiritar por dentro, mas eu não demonstrei, mantendo meu ar blasé. Fico parado ali na esperança de reviver aquelas sensações todas, mas não acontece, você não está ali.

Volto à rua numa noite escura, rua em que caminhávamos juntos todos os dias voltando do trabalho. Você sempre chegava em casa antes, mas fazia questão de me levar até à esquina. Refaço nossos passos, olho tua antiga e velha casa e controlo a vontade flamejante de bater na porta esperando ansioso você vir abrir. Você não virá.

Revivo insistentemente o momento mais terno de nós dois, você me acompanhando cuidadoso e cauteloso até o médico, depois que passei mal no trabalho. Nos meus sonhos mais doces você segurava minha mão. Fecho os olhos bem forte pra sentir seu toque, mas é inútil. Você nunca segurou a minha mão.

Seu sorriso dança nos meus pensamentos. Os olhos matreiros por trás das lentes discretas me absorvem. Até as feiosas entradas se tornam irresistivelmente charmosas. Lembro da tua frieza, tua dificuldade de amar e principalmente de ser amado. Teu medo do meu sentimento. 

Aperto o play da minha memória e ouço de novo tuas confissões, me contando que já recebeu dinheiro por sexo; que já tinha experimentado várias drogas, mas era só usuário de maconha; a forma como usava as pessoas pra obter prazer sem sentir um pingo de culpa e me dizendo com jeito de menino arrependido que não valia nada, que era um puto inconteste. Era como um aviso: eu não valho à pena!

E eu queria me convencer disso, deixar de sentir essa coisa profunda, amável e apaixonante que eu sentia por ti, mas não saía de mim. E o resultado foi um coração partido mais uma vez, não por falta de aviso, mas por falta de consumação. Talvez eu não tivesse me importado de sofrer se você não tivesse sido só um sonho, uma ilusão. Eu seria feliz apenas com as lembranças, se elas não fossem só conjecturas.

Você me deu muito pouco, e fiz desse pouco uma imensidão. Hoje revisito minhas memórias, refaço nossos poucos caminhos, volto àquela estação, à rua, ao hospital. Sua imagem é miragem, neblina onde mergulho e me perco na imensidão utópica dos meus devaneios, me arrasto, me debato, me martirizo, porque agora e pra sempre não tem mais jeito, você será apenas memória.   

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